No
mês de junho, o Brasil se transformou no palco mais recente das
mobilizações mundiais. Milhares de pessoas saem às ruas para
manifestar o seu descontentamento. O movimento começa pelas
principais cidades e se espalha por todas as capitais. Atualmente,
até pequenas cidades do interior tem sediado diversas manifestações.
Muitos afirmam que o “gigante acordou” Mas quem é esse gigante
e o que ele quer?
O
pioneirismo porto-alegrense
O
primeiro que devemos perguntar é de onde surgem estas manifestações.
A mídia burguesa e alguns partidos políticos tentam afirmar que
esta vem do espontaneísmo das ruas. Esta é apenas parte da verdade.
O que falta afirmar é que estas mobilizações são decorrentes de
outras que vinham gestando este movimento.
As
eleições municipais de 2012 foram marcadas pelo esvaziamento de
projetos de cidade. A maioria dos partidos assumiram o discurso do
bom gestor despolitizando a eleição. Em paralelo a isso, os
problemas da cidade começam a ser discutidos por outros atores
organizados. Entre eles devemos citar o movimento “Massa Crítica”
que questiona o espaço dos carros na cidade e exige a construção
de ciclovias; o movimento contra a remoção dos moradores em áreas
de obras da Copa do Mundo (que em 2014 será no Brasil) e o movimento
“Defesa Pública da Alegria” que luta contra a privatização de
espaços públicos (praças, largos e outros pontos da cidade que
estão sob controle de empresas privadas).
Passada
a eleição, a prefeitura de Porto Alegre atende uma nova solicitação
de aumento das passagens de ônibus. Junto a isto, o prefeito José
Fortunati e seu vice decidem cortar várias árvores de um passeio
público para a ampliação de uma avenida. Esta obra faz parte das
chamadas “obras da Copa”. Iniciou-se então um movimento contra o
aumento da tarifa de ônibus. O movimento de crítica a esta política
começou tímido, com pequenas manifestações, foi tomando corpo
através das redes sociais até chegar a contar com mais de dez mil
pessoas. A vitória veio com a decisão da justiça de suprimir o
aumento.
O
resultado de Porto Alegre se espalhou pelas principais capitais do
Brasil. Em São Paulo e Rio de Janeiro foram organizados vários
protestos contra o aumento da passagem de ônibus que obrigaram os
governos a recuar e, em alguns casos, até a diminuir o valor da
tarifa cobrada.
À
medida que esta primeira reivindicação começava a ser atendida, as
manifestações começaram a receber novas pautas de reivindicação.
Algumas inclusive muito amplas como saúde e educação. A pauta que
era direcionada aos governos locais começa a tomar outra dimensão e
questionar governadores e a presidente do país.
A
disputa dos conservadores
No
início das manifestações, a reação da mídia capitaneada pela
Rede Globo foi a de desmoralizar as manifestações. Quando estas se
tornaram massivas e a mídia já não podia negar o seu apelo
popular, houve uma mudança na linha editorial das tevês e jornais.
Os mesmos começaram a defender as manifestações e criticar as
ações mais duras da polícia. Assim começou a tentativa de levar
aos manifestantes pautas mais conservadoras, entre elas se destacam a
diminuição de impostos e o fim da corrupção. A primeira, sem
qualquer conteúdo de classe é uma bandeira dos empresários, a
segunda, esconde o verdadeiro motor da corrupção que é o próprio
capitalismo.
Esta
onda conservadora teve uma repercussão imediata nas manifestações.
Estas foram tomadas por bandeiras verde-amarelas, cantava-se o hino
nacional. Os mesmos manifestantes que exigiam uma manifestação sem
violência hostilizavam os manifestantes que levavam bandeiras de
partidos, movimentos ou centrais sindicais. Houve até uma
infiltração de grupos de extrema-direita que identificavam e
perseguiam os militantes de esquerda.
O
surgimento desta violência direcionada à esquerda levou os
militantes de diferentes organizações a perceber que estávamos num
momento delicado. Se por um lado as manifestações de rua estavam
provando que tinha se quebrado o encanto de dez anos de governo do
PT, também demonstravam que a direita estava organizada e podia
levar para si os créditos das mobilizações populares.
Criou-se
nas últimas semanas uma política do medo, principalmente
disseminada via redes sociais, em que se afirmava que o movimento das
ruas havia sido tomado por fascistas, nazistas e militantes de
direita, em geral, para depor o governo PT, da presidente Dilma.
Falava-se tanto de um Golpe da Direita, quando de um Golpe Militar.
Havia na internet páginas que “indicavam” isso, desde a do
próprio Partido Militar Brasileiro, em que aparecia um candidato a
presidência e pesquisa sobre possíveis candidatos, até a postura
da mídia diante das manifestações, principalmente, da Rede Globo
de Televisão, que interrompeu sua programação para dar sua versão
sobre o que estava acontecendo no país. Quem lia as postagens
acreditava que a esquerda havia sido escorraçada pelo movimento da
direita que crescia nas ruas.
A
crise do capitalismo vem nos acompanhando por muitos anos e os países
aonde antes parecia não haver impacto, como diziam seus governantes,
já sentem a extensão do problema, e certamente o impacto tem sido,
como sempre, com maior intensidade nas camadas mais pobres da
sociedade. Sim, o Brasil também sente a crise do capitalismo embora
muitos jornais internacionais, antes destas manifestações faziam
crer que aqui estava tudo muito bem política e economicamente e
tenham recebido com surpresa as manifestações de insatisfação da
população. Compreende-se então, diante deste quadro, por que é
tão grande a aprovação e adesão da população às manifestações.
A
polícia brasileira, que a muito serve para manter os conservadores
na disputa, parece estar sofrendo cada vez mais de uma espécie de
Síndrome de Estocolmo, aquela em que um vítima pode desenvolver
emocionalmente, após um sequestro, assalto, violência qualquer, uma
espécie de identificação com seu algoz, defendendo este a qualquer
preço. No caso da polícia brasileira nos parece que esta Síndrome
vem se desenvolvendo em larga escala, pois sendo entre a categorias
de trabalhadores ela uma das mais exploradas no país mesmo assim
esta permanece firme em defesa do governo e dos interesses dos
grandes empresários. Em Porto Alegre, na marcha de 20 de junho, o
que se viu foi o oprimido defendendo um dos aparelhos de manutenção
da sua opressão. Dezenas de policiais militares foram deslocadas
para proteger específicamente o prédio da RBS de manifestantes que
nem tiveram muitas chances de se aproximar para gritar palavras de
ordem. Para quem não sabe o que é RBS, não é um órgão do poder
público, mas um Grupo de Telecomunicações, criado em 1957,
afiliado da Globo, que possui o um grande número de veículos de
comunicação conservadores de ampla circulação no sul do país:
desde o jornal Zero Hora, Diário Gaúcho, até televisão local como
TV Com, rádios como Rádio Rural, Atlântida, Itapema, entre muitas
outras, formando quase um monopólio da informação.
Entretanto,
a realidade está muito além do que as mídias tentam fazer a
população crer e a história das mobilizações no Brasil tem se
construído a cada dia de modo inesperado.
A
recomposição da esquerda
Este
cenário fez com que diversas organizações de esquerda como os
anarquistas, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) o Partido
Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), o Partido Comunista
Brasileiro (PCB) e muitos outros junto com movimentos sociais
fizessem um acordo nacional para atuar nas ruas de forma unificada,
levando às suas bandeiras e palavras de ordem. No dia 24 de junho a
esquerda conseguiu disputar as manifestações para o campo popular.
No
dia 24 de junho, o que se viu via redes sociais, não foi mencionado
pelas mídias televisivas que focaram suas atenções nos roubos pela
cidade. Neste dia ocorreu uma quebra no discurso de quem o movimento
era apartidário, anti-partidário, contra movimentos sociais, uma
vasta organização da esquerda, que se uniu por seu direito a
manifestar-se e propor um eixo de lutas que realmente podem modificar
a situação do país levou um número imenso de pessoas paras ruas.
Várias pessoas estavam com bandeiras, faixas e cartazes
representando suas organizações políticas.
Pela
mídia vemos um quadro simplificado do que realmente está
acontecendo no Brasil, de um lado dizem eles existem aqueles que são
os verdadeiros manifestantes, que gritam por paz e levam flores aos
policiais, do outro, os “vândalos” aqueles que quebram prédios
do Poder Público, que querem mais que gritar contra corrupção, que
é uma pauta óbvia, que picham frases de ordem, se defendem dos
desmandos da polícia, mas também contra-atacam. No meio disso tudo,
em muitas cidades vem acontecendo saques e depredações. E como a
mídia lê os saques? Na verdade não lhes interessa fazer uma
leitura disso, pois os saques são um reflexo das imposições do
capitalismo, são resultado do fetiche da mercadoria. Em cada foto
tirada, em cada vídeo, as pessoas que investiam contra lojas ou
bancos, queriam destruir aqueles símbolos da exploração,
conscientes ou inconscientes do que faziam, mostravam ódio,
ansiedade, angústia, necessidade. Haviam sim ladrões e isso pode
ocasionar uma análise apressada se não formos mais atentos, porém
as ações de roubo e fúria tem uma leitura mais ampla que esta. Os
roubos foram de objetos que não eram essenciais a vida: televisores,
eletrodomésticos, chocolates, peças de carros, chicletes, revistas,
livros...Eles queriam consumir. Como podemos ler isso senão os
marginalizados querendo tomar aquilo que lhes é negado em cada dia
de trabalho alienado ou desemprego? Como podemos ler isso?
Essa
manobra de criar um simples dualismo, busca criminalizar a tudo e a
todos que se opuserem ao Estado ou a ordem do capitalismo. No dia 21
de junho, por exemplo, a Federação Anarquista Gaúcha denunciou que
uma sede do Movimento Anarquista, o Ateneu Libertário, foi invadida
por policiais sem nenhuma ordem judicial. Onde está o direito a
livre expressão política? Que país democrático é este? A
democracia no Brasil é uma mentira que agora fica mais clara que
nunca.
A
união da esquerda, a ampliação das manifestações pelo Brasil, o
surgimento de mobilizações nas periferias a despeito da opressão
policial ser mais violenta lá do que nas zonas centrais das cidades
(no Complexo da Maré, Rio de Janeiro, foram 9 morto, depois da
manifestação quando o BOPE, entrou lá no dia 24 de junho), a
consolidação de uma pauta que busca os direitos reais da população,
a atenção dos governos que vem retomando textos normativos que
eram importantes para a garantia de direitos, após perceberem a
dimensão das manifestações, constituem um ótimo ritmo de
caminhada para um destino ainda por se construir em cada luta, em
cada ocupação de espaços, em cada articulação.
As
manifestações são necessárias e não acabarão diante da redução
de uma tarifa, ou de um direito qualquer afirmado, é necessário que
dêem mais resultados e acorde as pessoas contra a exploração, a
opressão, e principalmente, contra o principal culpado pela situação
social, política e econômica do país e do mundo: o capitalismo.
Coletivo
Alternativa Autogestionária/Brasil/RS
O primeiro que devemos perguntar é de onde surgem estas manifestações. A mídia burguesa e alguns partidos políticos tentam afirmar que esta vem do espontaneísmo das ruas. Esta é apenas parte da verdade. O que falta afirmar é que estas mobilizações são decorrentes de outras que vinham gestando este movimento.
A recomposição da esquerda
Este cenário fez com que diversas organizações de esquerda como os anarquistas, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), o Partido Comunista Brasileiro (PCB) e muitos outros junto com movimentos sociais fizessem um acordo nacional para atuar nas ruas de forma unificada, levando às suas bandeiras e palavras de ordem. No dia 24 de junho a esquerda conseguiu disputar as manifestações para o campo popular.
Coletivo
Alternativa Autogestionária/Brasil/RS
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